terça-feira, 21 de outubro de 2008

TRF-4 – incidência da multa do art. 475-J do CPC apenas sobre o valor controvertido em impugnação rejeitada

Não tenho o costume de acompanhar o Informativo Semanal do TRF-4, mas a Karin me deu notícia de um julgado que constou do Informativo 4.ª Região n.º 372 a respeito da questão da multa do art. 475-J do CPC.

Trata-se de decisão proferida em sede de agravo de instrumento (AGVAG 2008.04.00.033099-0/TRF, julg. em 07/10/2008), na qual a Rel. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida (da 2.ª Turma do TRF-4) adotou o entendimento de que, no prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC, caso o devedor discorde dos valores apontados pelo credor (art. 475-B do CPC), deve depositar o valor que entende devido, oferecendo impugnação em relação ao restante do cálculo (excesso de execução), sendo que a multa de 10% só incidirá sobre o valor controvertido caso seja rejeitada a impugnação.

A Relatora transcreveu, inclusive, nesse sentido, excerto de artigo de Sérgio Shimura na obra “Aspectos polêmicos da nova execução de títulos judiciais, Lei 11.232/2005” (coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, pg. 568).

Compartilho desse entendimento, conforme o post abaixo.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Exame de Ordem 03/2007 – OAB/RS – questões sobre penhora e alienação

Acredito que é oportuno, além de comentar alguma jurisprudência dos tribunais, ou casos curiosos a respeito do processo de execução (e outros instrumentos, consoante advertido na epígrafe do blog), analisar algumas questões de concursos sobre a matéria.

Consultei o site da OAB/RS para acessar os Exames de Ordem mais recentes; dos disponíveis, verifiquei que no Exame 01/2008 não foram cobrados conhecimentos sobre execução ou cumprimento de sentença. Mas no Exame 03/2007, na prova objetiva, constaram duas questões: uma a respeito da penhora e outra sobre a fase de alienação. Suguem transcritas:

83. Com relação à penhora de imóveis, assinale a assertiva
correta.
(A) Far-se-á por termo nos autos, independentemente
de onde o imóvel estiver localizado.
(B) Far-se-á sempre por oficial de justiça.
(C) Não se exigirá a intimação de devedor quando
feita por oficial de justiça.
(D) Não pode sua averbação ser feita por meio eletrô-
nico.

84. Com relação à alienação, os bens penhorados serão
prioritariamente
(A) adjudicados pelo credor.
(B) alienados em hasta pública.
(C) alienados particularmente pelo credor.
(D) alienados antecipadamente.

Para ambas as questões, a resposta correta é a da alternativa A.

Como se sabe, a atual formatação do Exame de Ordem é de uma prova objetiva longa, de 100 questões sobre quase todo o programa do curso de direito. Então as questões devem ser redigidas de forma breve e direta, para dar tempo de quem estiver prestando a prova conseguir responder todas no tempo previsto.

Pois bem. A penhora é um típico ato processual executivo, mediante a qual se individualiza um bem do devedor para sobre ele (o bem) recair os demais atos constritivos (avaliação e alienação) na chamada “execução por quantia certa contra devedor solvente”. O art. 646 do CPC estatui que esta tem por objeto a expropriação de bens do devedor para satisfazer o direito do credor.

Quando a penhora recai sobre bem imóvel, exige uma série de cuidados para evitar a oposição de embargos de terceiros, ou mesmo de embargos à execução, tendo em vista a questão da impenhorabilidade do imóvel de família, a atualidade do domínio (não raro são transferidos sem o competente registro imobiliário), eventual ocupação por terceiros (p. ex., invasão), eventuais restrições (hipoteca, alienação fiduciária, penhoras de outros credores), de maneira que nem sempre é suficiente a verificação da matrícula atualizada do imóvel para garantir uma penhora pacífica.

A questão em comento pede apenas que se saiba a formalização da penhora de bem imóvel. E a resposta está na análise conjugada de dois dispositivos legais: (a) § 4.º do art. 659 do CPC, com redação dada pela Lei n.º 11.382/2006, segundo o qual “A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exeqüente, sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 652, § 4.º), providenciar, para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, a respectiva averbação no ofício imobiliário, mediante a apresentação de certidão de inteiro teor do ato, independentemente de mandado judicial”. Nesse caso, o (b) § 5.º do art. 659 do CPC, acrescentado pela Lei n.º 10.444/2002 estatui que “(...) quando apresentada certidão da respectiva matrícula, a penhora de imóveis, independentemente de onde se localizem, será realizada por termo nos autos, do qual será intimado o executado, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado, e por este ato constituído depositário”.

Então, é errado dizer que será sempre feita a penhora de imóvel por oficial de justiça, e que caso realizada por oficial de justiça seria dispensada a intimação do devedor (o art. 659, § 4.º expressa que deverá ser feita “imediata intimação do executado”, inclusive se reportando ao art. 652, § 4.º, que, por sua vez, se refere à conduta do § 1.º; em outras palavras, o executado é citado para pagar o débito em 3 dias (caput do art. 652); decorrido o prazo sem pagamento, o oficial de justiça penhora e avalia bens do devedor, lavrando o auto de penhora e intimando, “na mesma oportunidade” o executado. Essa intimação, pois, se fará na pessoa do advogado do devedor, ou, caso este não tenha procurador constituído, será intimado pessoalmente. Quanto à averbação da penhora de bem imóvel (assim como a de bem móvel e a penhora de numerário) por meio eletrônico, o § 6.º do art. 659 do CPC, acrescentado pela Lei n.º 11.382/2006 faculta essa providência, desde que “obedecidas as normas de segurança que forem instituídas, sob critérios uniformes, pelos Tribunais”.

A outra questão versa sobre alienação, que é a fase posterior à avaliação, na qual se pressupõem superadas todas as questões impeditivas do prosseguimento da execução (como embargos, etc.). O art. 647, caput do CPC fala em expropriação com o mesmo sentido de alienação como gênero, e os incisos (com redação dada pela Lei n.º 11.382/2006) cuidam das espécies: adjudicação pelo exeqüente (ou pessoas enumeradas no art. 685-A, §2 .º); alienação por iniciativa particular; alienação em hasta pública; usufruto de bem móvel ou imóvel. Todas essas modalidades de expropriação são disciplinadas a partir do art. 685-A até o art. 707, e em relação ao usufruto de bem móvel ou imóvel o regramento se encontra no art. 716 até 724. Convém registrar que a Lei n.º 11.382/2006 promoveu diversas alterações na redação e na própria numeração dos artigos em relação à redação anterior.

Então, se se quiser entender que o art. 647 estabeleceu uma ordem de preferência na expropriação dos bens penhorados, e diante da redação conferida aos arts. 685-A, 685-C, 686 e 716 do CPC, na qual se observa uma ordem por eliminação. E aí realmente se poderia dizer que “prioritariamente” a alienação dos bens penhorados será mediante adjudicação ao credor.

Entretanto, essa prioridade é relativa e, salvo engano, não pode ser imposta ao credor, que pode preferir, desde já, a tradicional alienação judicial (em hasta pública).

Para quem estiver interessado, o inteiro teor da prova pode ser obtido diretamente no site da OAB/RS, ou por este link.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Prazo para a impugnação ao cumprimento de sentença no caso de depósito em dinheiro

Um tema do qual gosto de ler e de escrever é o que diz respeito ao cumprimento de sentença. Essa modificação introduzida pela Lei n.º 11.232/05 mediante acréscimo do art. 475-J e seguintes trouxe muitas questões jurídicas sobre as quais ainda não há consenso, sendo certo que todas elas têm efeitos práticos importantes.

Particularmente, entendo o seguinte: após a intimação das partes de que os autos retornaram da instância de origem, oportunizando que as mesmas digam o que entenderem devido para o prosseguimento do feito, se for o caso, o vencido deve promover o cumprimento de sentença no prazo de 15 dias sob pena de acréscimo da multa de 10% e expedição de mandado de penhora. Para essa hipótese, estou admitindo que o valor a ser pago ao credor pode ser facilmente obtido mediante cálculos aritméticos, como é o caso da condenação ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em percentual sobre o valor da causa, ou em montante fixo (ex., mil reais). Assim, em sendo possível ao vencido efetuar o cálculo da condenação, deve promover o pagamento espontaneamente. Isso tem a importância de evitar uma manifestação do credor requerendo a intimação do devedor para cumprir a sentença na forma do art. 475-J do CPC, instruindo o pedido com cálculo (art. 475-B do CPC) contendo valores excessivos (p. ex., por corrigir o débito mediante índice equivocado, ou por fazer contar juros moratórios e multa não previstos no título executivo judicial transitado em julgado – não é incomum esses pedidos com notório excesso de execução). Além disso, talvez isso seja o mais importante, essa conduta do vencido pode afastar o inconveniente do arbitramento de mais um valor a título de honorários nessa fase de cumprimento de sentença, sobretudo diante do entendimento recente do STJ nesse sentido.

Mas é defensável o entendimento de que a interpretação conjugada do art. 475-B e do art. 475-J do CPC impõem a iniciativa do credor para inaugurar a fase de cumprimento de sentença. Então, nessa hipótese, tão logo se dê o trânsito em julgado, ou a intimação do trânsito em julgado, ou a intimação de retorno dos autos à instância de origem (parece-me que é neste último momento, conforme o art. 475-P, II do CPC), o credor deve requerer a intimação do devedor para o cumprimento de sentença, instruindo o pedido com o cálculo atualizado do débito (se for o caso de meros cálculos aritméticos). Não há problemas se o devedor aquiesce e deposita o valor exigido. Mas o devedor tem a faculdade de se opor mediante impugnação, no mesmo prazo que teria para pagar o montante da condenação, que só pode versar sobre as hipóteses previstas no art. 475-L do CPC, uma das quais o excesso de execução (inciso V), e nesse caso, o § 2.º do mesmo dispositivo legal impõe ao executado o ônus de declarar de imediato o valor que entende correto.

Pois bem, o CPC não exige, para o processamento da impugnação, o depósito do montante da condenação, seja o valor incontroverso ou o exigido pelo credor. Como medida para dar agilidade, demonstrar a boa-fé, e minorar eventual sucumbência (notadamente, multa de 10% do art. 475-J e honorários advocatícios), entendo conveniente depositar o valor entendido como incontroverso (isto é, atualizado pelo índice correto, sem acréscimo de juros e multa não previstos no título executivo judicial) e impugnar o pedido do credor pela diferença. Tudo isso no mesmo ato, ou melhor, na mesma oportunidade. Em outras palavras, recolhe-se o valor tido como devido e junta-se o comprovante na petição de impugnação ao cumprimento de sentença, no prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC.

Saliento que em relação a essa conduta já vi tanto o processamento da impugnação, com intimação do credor para manifestação e posterior sentença, como também intimação para complementar o depósito, a fim de que compreenda a integralidade do valor exigido pelo credor, incidindo a multa de 10% apenas sobre essa diferença.

Mas admito que permanecia com a dúvida a respeito do real prazo para a impugnação ao cumprimento de sentença em caso de depósito do valor da condenação (integral ou parcial): 15 dias da intimação para cumprimento de sentença, ou 15 dias a partir do depósito, ou 15 dias a partir da intimação do depósito? Soube que esse entendimento último, de que o prazo para impugnação seria contado a partir do depósito, teve acolhida por parte de alguns juízes, tendo em vista o que dispõe o art. 475-J, § 1.º do CPC, segundo o qual o prazo para impugnação seria de 15 dias contados da intimação (na pessoa do advogado do devedor) do auto de penhora e avaliação. Particularmente, preferi o mais prático: 15 dias da intimação para cumprimento de sentença, pagando e impugnando simultaneamente na mesma peça.

No Informativo n.º 369 do STJ, constou notícia de julgado (REsp 972.812-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/9/2008) no qual constou que o prazo para impugnação ao cumprimento de sentença é contado do depósito em dinheiro, não havendo que se falar em intimação do devedor a respeito do depósito que ele mesmo efetuou, para só a partir daí contar o prazo para impugnação. Entendeu-se que a finalidade da intimação do devedor é alcançada com o próprio depósito, que é a garantia da execução, e significaria para o devedor a perda da disponibilidade do numerário depositado. Além disso, há o significado da vantagem para o credor, tendo em vista a ordem de preferência para penhora do art. 655 do CPC, o que lhe retira o interesse em eventual recusa da nomeação. Então, com base nesse entendimento recente do STJ, caso o devedor promova o depósito do montante da condenação, o prazo de 15 dias para a impugnação é contado da data do referido depósito.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Honorários advocatícios no cumprimento de sentença

A idéia de alterar o CPC para agilizar o rito da execução de sentença sempre me pareceu genial, sobretudo porque considerava uma incrível perda de tempo (a) ajuizar ação de cobrança para (b) obter sentença condenatória, e, só aí, (c) citar o devedor para pagar ou penhorar bens. Afinal, depois da sentença que condena alguém a pagar a outrem alguma coisa deveria prescindir de outro processo; é intuitivo que a alguém que foi condenado (com decisão transitada em julgado) a pagar algo só compete isso, pagar a condenação. Só que o sistema tradicional do CPC impunha ao credor o trâmite de uma ação ordinária, para que fosse reconhecida a existência da dívida e também proferida a palavra mágica (“condeno o devedor a pagar ‘x’”), e só assim viabilizar o ingresso na fase executiva, mas mediante um processo próprio (de execução), com citação e prazo para embargos (isso tudo tinha uma razão histórica, muito bem esmiuçada e desenvolvida em praticamente todos os livros do Ovídio Baptista da Silva).

Pois bem, como se sabe, a Lei n.º 11.232/05 veio para alterar o CPC e tornar a fase de execução de sentença (ou cumprimento de sentença) um mero desdobramento da ação que tramita sob o rito ordinário ou monitório, se for o caso. O devedor não mais seria citado para pagar ou nomear bens à penhora (em 2004 assisti a uma palestra proferida por Athos Gusmão Carneiro sobre essa e outras reformas no CPC - sobre isso escrevi uma resenha aqui). Além disso, os embargos à execução de título judicial foram substituídos pela impugnação ao cumprimento de sentença. A tônica da mudança foi a de imprimir celeridade processual e economia de atos, em atenção ao princípio da efetividade.

Só que a alteração legislativa, me parece que deixou a descoberto inúmeras questões relevantes (e, assim, tenho a impressão que a reforma se deu de forma incompleta, ou, dito de outra forma, poderia ter sido feita de maneira mais esclarecedora sobre certos assuntos). Uma delas, bastante expressiva, é a que diz respeito à possibilidade de fixação de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. Afinal, são estes devidos? Caso positivo, a partir de qual momento processual: (I) inicialmente, antes mesmo do devedor cumprir espontaneamente a sentença, (II) quando o devedor permanecer inerte no prazo de 15 dias, ou (III) somente se houver impugnação?

Tão logo me deparei com essa questão, firmei a convicção de que:

(a) o devedor deve promover o cumprimento de sentença, independentemente do pedido do credor, caso lhe seja possível efetuar o cálculo do valor devido, no prazo de 15 dias após a intimação da baixa dos autos à origem (ou outra intimação que dê conta às partes do trânsito em julgado da sentença, com prazo para requererem o que entenderem de direito, v.g.) – mas admito que é defensável (e talvez preferível) o entendimento de que, na verdade, o credor deve juntar aos autos o cálculo do que entende devido e requerer a intimação do devedor para cumprir a sentença, na forma do art. 475-B e do art. 475-J do CPC;

(b) o devedor, aquiescendo com o cálculo, paga o valor exigido pelo credor no prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC. Nesse caso não há que se falar em multa, nem em honorários advocatícios.

Diversamente, se o devedor permanece inerte, o processo deve seguir conforme o art. 475-J do CPC, i. é, com acréscimo da multa de 10% e expedição de mandado de penhora. Talvez aí, admito, se pudesse falar em arbitramento de honorários advocatícios em favor do credor.

Em outra hipótese, caso o devedor entenda, v.g., que houve excesso de execução, deve promover a impugnação (indicando o valor que entende correto – art. 475-L, V e art. 475-L § 2.º do CPC), e caso reste vencido, deve haver condenação ao pagamento de honorários advocatícios. Então, numa interpretação pessoal e preliminar, os honorários advocatícios, na fase de cumprimento de sentença, só seriam cabíveis se houvesse impugnação.

Após notícias isoladas de julgados do STJ e do TRF-4, o Informativo n.º 359 do STJ deu conta de um julgado (REsp 1.050.435-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 10/6/2008) no qual se entendeu que os honorários advocatícios são cabíveis na fase de cumprimento de sentença, independentemente da eventual impugnação. Os argumentos são: (a) a alteração da execução de título judicial para cumprimento de sentença, por si só, não significa nada em relação aos honorários advocatícios, pois o cumprimento de sentença se faz por execução (art. 475-I do CPC), e nas execuções, embargadas ou não, são devidos honorários advocatícios (art. 20, § 4.º do CPC); (b) a verba honorária arbitrada na sentença diria respeito apenas ao trabalho realizado no processo de conhecimento; (c) o “espírito” da Lei n.º 11.232/05 seria o de impor ônus ao devedor recalcitrante, pois “De nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação”.

Parece-me, então, que caso o devedor cumpra espontaneamente a sentença, pagando o valor do débito no prazo dos 15 dias (contados do trânsito em julgado, ou da baixa dos autos à origem, ou da intimação para cumprir sentença sob pena de incidência da multa de 10%), não é cabível o arbitramento de honorários advocatícios. Conforme o entendimento do STJ, que me parece, afinal, bastante defensável, a verba honorária seria devida apenas se o devedor restar inerte no prazo de 15 dias (então ficaria submetido à multa de 10% e também aos honorários advocatícios arbitrados pelo Juízo), ou oferecer impugnação e restar vencido (aí é indiscutível a incidência da verba honorária, pelo princípio da causalidade e da sucumbência).

Para ler mais sobre cumprimento de sentença clique aqui.

Adendo em 09.09.2009: essa questão segue atual na jurisprudência do STJ, tendo em vista notícia do Informativo n.º 398 (REsp 1.053.033-DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 9/6/2009).

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Execuções fiscais do FGTS - Súmulas n.ºs 349 e 353 do STJ

Já tive a oportunidade para dizer que acredito que algumas súmulas dos tribunais superiores dizem o óbvio. Da mesma forma, entendo que algumas súmulas se aplicam para um número de casos bastante restrito, ou, dito de outra forma, a aplicação de determinadas súmulas não faz parte do dia-a-dia de parte significativa dos operadores do direito. No Informativo n.º 359 do STJ constou notícia dando conta da publicação de duas súmulas a respeito das execuções fiscais do FGTS. E entendo que essas súmulas, as de n.º 349 e de n.º 353, fazem parte desse grupo de súmulas que podem passar despercebidas pela maioria dos juristas. Mas se tratam de súmulas importantes para quem lida com as execuções fiscais do FGTS.

O STF já definiu, ainda no regime anterior à CF/88 (RE 100249/SP, Relator p/ Acórdão: Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ 01-07-1988) que o FGTS não tem natureza tributária. Trata-se de um fundo constituído na forma da Lei n.º 8.036/90 pelos saldos das contas vinculadas dos trabalhadores e de outros recursos a ele incorporados (art. 2.º), cuja gestão de aplicação será efetuada pelo Ministério da Ação Social, cabendo à CEF o papel de agente operador (art. 4.º). A aplicação dos recursos do FGTS se dá na forma do caput e parágrafos do art. 9.º. No art. 15 consta a obrigação de todos os empregadores a depositar, até o dia 7 de cada mês, em conta bancária vinculada, o valor de 8% da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador. No art. 18 consta a forma de cumprimento da obrigação de depositar o FGTS por parte do empregador em caso de rescisão do contrato de trabalho. Por fim, no art. 23 consta que ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social a competência para verificar, em nome da CEF, o cumprimento da lei “especialmente quanto à apuração dos débitos e das infrações praticadas pelos empregadores ou tomadores de serviço”. É significativo o que consta (a) do inciso I do § 1.º desse art. 23, isto é, que constitui infração para efeito da Lei n.º 8.036/90 (infração à lei, pois) “não depositar mensalmente o percentual referente ao FGTS, bem como os valores previstos no art. 18 desta Lei, nos prazos de que trata o § 6.º do art. 477” da CLT, e (b) do § 6.º do art. 23, segundo o qual é trintenária a prescrição dos valores referentes ao FGTS.

A Lei n.º 8.844/94, que dispõe sobre, entre outras coisas, a cobrança judicial das contribuições e multas devidas ao FGTS, estatui que (a) ao Ministério do Trabalho compete a fiscalização e apuração das contribuições devidas ao FGTS, bem como aplicação de multas e encargos, e (b) compete à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a inscrição em Dívida Ativa dos débitos para com o FGTS bem como, diretamente ou por intermédio da CEF, mediante convênio, a representação judicial e extrajudicial do FGTS para a correspondente cobrança (arts. 1.º e 2.º). Nessa lei consta, ainda, a isenção de custas do FGTS nos processos judiciais de cobrança de seus créditos (§ 1.º do art. 2.º), e a atribuição aos créditos do FGTS dos mesmos privilégios dos créditos trabalhistas (§ 3.º do art. 2.º).

Em conformidade com o que facultou o art. 2.º da Lei n.º 8.844/94, a PGFN e a CEF firmaram convênio, e assim, em apertada síntese, aos advogados da CEF compete a condução das execuções fiscais referentes aos créditos do FGTS ajuizadas a partir de 1994.

É intuitivo que se imprimiu um regime peculiar à cobrança dos créditos do FGTS, afinal (a) segue-se o rito das ações de execução fiscal, (b) o crédito não é tributário, e (c) a condução dos processos é feita por advogados da CEF (que se submetem ao regime da CLT, pois a empregadora é uma empresa pública), e isso repercute em questões como, v.g., saber se se aplicam os privilégios processuais da Fazenda Pública (como intimação pessoal, prazo em dobro para contestar, recorrer ou falar nos autos, execução contra a Fazenda Pública, aplicação dos dispositivos a respeito do Código Tributário Nacional).

Para tentar dirimir algumas dessas controvérsias, é que o STJ fez publicar as súmulas já referidas. A de n.º 349 dispõe que “Compete à Justiça Federal ou aos juízes com competência delegada o julgamento das execuções fiscais de contribuições devidas pelo empregador ao FGTS”. A de n.º 353 estabelece que “As disposições do Código Tributário Nacional não se aplicam às contribuições para o FGTS”.

A controvérsia jurídica que deu ensejo à Súmula n.º 349 teve origem a partir da promulgação da EC n.º 45/2004 que, dentre outras importantes novidades, ampliou a competência da Justiça do Trabalho. Assim, alguns juízes federais entenderam que, como o FGTS é decorrente da relação de trabalho (o empregador deposita o percentual previsto na Lei n.º 8.036/90 na conta vinculada do empregado), e aos juízes do trabalho compete processar e julgar as causas oriundas das relações de trabalho (CF/88, art. 114, I), a execução fiscal dos valores do FGTS deveria ser processada e julgada perante a Justiça do Trabalho. Conforme constou de um dos julgados que deram origem à súmula (CC 53878 SP, DJ 13/02/2006), não há que se confundir a execução fiscal das dívidas do FGTS com a relação de trabalho subjacente, pois não envolve diretamente empregador e empregado; a relação que se estabelece é decorrente da lei (a Lei n.º 8.036/90) e não da vontade das partes, sendo certo que, em sede de ação de execução fiscal, se cuida de uma relação de direito público entre a União (ou a CEF) e os empregadores inadimplentes com o FGTS, e não de direito privado decorrente do contrato de trabalho.

Quanto à Súmula n.º 353 (“As disposições do Código Tributário Nacional não se aplicam às contribuições para o FGTS”), a questão não me parece tão simples. Conforme essa súmula, uma vez que as contribuições para o FGTS não são de natureza tributária, não se aplicariam as disposições do Código Tributário Nacional. Realmente, esse entendimento era prevalecente na jurisprudência do STJ e do TRF-4 (não por acaso virou súmula). Mas não estou certo quanto ao acerto dessa orientação. Afinal, em se tratando de ação de execução fiscal, que se presta (arts. 1.º e 2.º da Lei n.º 6.830/80) para a cobrança de dívida ativa tributária ou não-tributária (definidas pela Lei n.º 4.320/64) da Fazenda Pública (dos quatro entes federados e suas autarquias), a Lei n.º 6.830/80 dispõe que à “Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial” (art. 4.º, § 2.º). Parece-me que o dispositivo tem redação muito clara: são aplicáveis as normas relativas à responsabilidade previstas na legislação tributária (p. ex., o CTN) quando se tratar de execução fiscal das dívidas ativas da Fazenda Pública de qualquer natureza, isto é, as tributárias e as não-tributárias. Se é certo que o FGTS não tem natureza tributária, então os valores de FGTS são inscritos como dívida ativa não-tributária, e as ações de execução fiscal são ajuizadas dessa forma. Então, por se submeterem ao rito das ações de execução fiscal, é que deveriam ser aplicáveis as normas de atribuição de responsabilidade previstas na legislação tributária, ou, mais especificamente, no CTN.

Em que pese esse raciocínio, a jurisprudência sempre foi no sentido de ignorar essa disposição da lei de execuções fiscais, enfatizando apenas que o FGTS não tem natureza tributária, e por essa razão seria inaplicável o CTN. A questão tem uma importância fundamental de ordem prática: em número significativo de ações de execução fiscal do FGTS, a empresa devedora ou (a) não é localizada, por diferentes razões, a mais comum delas, a sua dissolução irregular (i. é, sem baixa dos atos constitutivos na Junta Comercial), (b) não tem patrimônio penhorável. Isso daria ensejo à aplicação do art. 135 do CTN, que impõe a responsabilidade pessoal pelas dívidas fiscais do sujeito passivo da obrigação tributária aos (entre outros) diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, pelos atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Bem, se a simples inadimplência de tributo, conforme a jurisprudência majoritária, não configura, por si só, infração de lei, o art. 23, I da Lei n.º 8.036/90 estabelece que é infração à Lei n.º 8.036/90 o não pagamento dos valores do FGTS, consoante já se viu. Entretanto, os tribunais optaram por sonegar a aplicação do CTN em sede de ação de execução fiscal, e assim o exeqüente (FGTS representado pela CEF ou pela PGFN) tem que pleitear o redirecionamento da execução fiscal em face dos sócios-gerentes com base na legislação civil (Decreto n.º 3.708/10 ou Código Civil).

Cliquei nos precedentes que deram origem à Súmula (conforme consta do site do STJ) para ver como o STJ superou essa questão e como interpretou essa interação entre Lei n.º 6.030/80, Lei n.º 8.036/90 e o CTN. Para minha surpresa, dos 4 precedentes indicados no site do STJ (RESP 396275/PR, DJ 28/10/2002, RESP 438116/DF, DJ 12/06/2006, RESP 898274/SP, DJ 01/10/2007, RESP 981934/SP, DJ 21/11/2007) não houve qualquer referência aos dispositivos da Lei n.º 6.830/80 e da Lei n.º 8.036/90. No RESP 610595/RS, DJ 29/08/2005, não houve prequestiomanento, e assim a matéria não foi conhecida. E, por fim, no RESP 837411/MG, DJ 19/10/2006 a questão sequer foi enfrentada (apesar de prequestionada e referida no relatório).

Parece-me que isso é muito pouco para sedimentar um entendimento numa súmula. Sobretudo quando em data recente (13.06.2008) tomei ciência de uma notícia de um julgado do Tribunal Regional do Trabalho da 3.ª Região que reconheceu a responsabilidade de sócio de empresa falida, identificado na CDA como co-responsável na ação de execução fiscal, em relação à multa administrativa por infração de dispositivo da CLT, de natureza não-tributária. O TRT-3 expressou, na oportunidade, o entendimento de que em se tratando de multa inscrita em dívida ativa da União e cobrada via execução fiscal sob condução da Fazenda Nacional, são aplicáveis as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, consoante preconiza o art. 4.º, inciso V e § 2.º da Lei n.º 6.830/80. In verbis: "De acordo com a regra do art. 2o, caput, da Lei 6.830/80, a dívida ativa da União é aquela definida como tributária ou não tributária, na forma da Lei 4.320/64, sendo assim considerado qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei à União e suas respectivas autarquias (art. 2o, § 1o e art. 1o da Lei 6.830/80). Este é, precisamente, o caso das multas administrativas, que, embora tenham natureza não tributária, têm a cobrança atribuída à Fazenda Nacional" (TRT-3, AP n.º 00694-2007-057-03-00-4).